sábado, 27 de outubro de 2012


Game Reforma Ortográfica
Para aprender  brincando o acordo ortográfico da língua portuguesa, acesse o site:


http://www.fmu.br/game/home.asp




O HOMEM QUE SABIA JAVANÊS
Lima Barreto

Em uma confeitaria, certa vez, ao meu amigo Castro, contava eu as partidas que havia pregado às convicções e às respeitabilidades, para poder viver.
Houve mesmo, uma dada ocasião, quando estive em Manaus, em que fui obrigado a esconder a minha qualidade de bacharel, para mais confiança obter dos clientes, que afluíam ao meu escritório de feiticeiro e adivinho. Contava eu isso.
O meu amigo ouvia-me calado, embevecido, gostando daquele meu Gil Blas vivido, até que, em uma pausa da conversa, ao esgotarmos os copos, observou a esmo:
- Tens levado uma vida bem engraçada, Castelo !
- Só assim se pode viver... Isto de uma ocupação única: sair de casa a certas horas, voltar a outras, aborrece, não achas? Não sei como me tenho agüentado lá, no consulado !
- Cansa-se; mas, não é disso que me admiro. O que me admira, é que tenhas corrido tantas aventuras aqui, neste Brasil imbecil e burocrático.
- Qual! Aqui mesmo, meu caro Castro, se podem arranjar belas páginas de vida. Imagina tu que eu já fui professor de javanês!
- Quando? Aqui, depois que voltaste do consulado?
- Não; antes. E, por sinal, fui nomeado cônsul por isso.
- Conta lá como foi. Bebes mais cerveja?
- Bebo.
Mandamos buscar mais outra garrafa, enchemos os copos, e continuei:
- Eu tinha chegado havia pouco ao Rio estava literalmente na miséria. Vivia fugido de casa de pensão em casa de pensão, sem saber onde e como ganhar dinheiro, quando li no Jornal do Comércio o anuncio seguinte:
"Precisa-se de um professor de língua javanesa. Cartas, etc." Ora, disse cá comigo, está ali uma colocação que não terá muitos concorrentes; se eu capiscasse quatro palavras, ia apresentar-me. Saí do café e andei pelas ruas, sempre a imaginar-me professor de javanês, ganhando dinheiro, andando de bonde e sem encontros desagradáveis com os "cadáveres". Insensivelmente dirigi-me à Biblioteca Nacional. Não sabia bem que livro iria pedir; mas, entrei, entreguei o chapéu ao porteiro, recebi a senha e subi. Na escada, acudiu-me pedir a Grande Encyclopédie, letra J, a fim de consultar o artigo relativo a Java e a língua javanesa. Dito e feito. Fiquei sabendo, ao fim de alguns minutos, que Java era uma grande ilha do arquipélago de Sonda, colônia holandesa, e o javanês, língua aglutinante do grupo maleo-polinésico, possuía uma literatura digna de nota e escrita em caracteres derivados do velho alfabeto hindu.
A Encyclopédie dava-me indicação de trabalhos sobre a tal língua malaia e não tive dúvidas em consultar um deles. Copiei o alfabeto, a sua pronunciação figurada e saí. Andei pelas ruas, perambulando e mastigando letras. Na minha cabeça dançavam hieróglifos; de quando em quando consultava as minhas notas; entrava nos jardins e escrevia estes calungas na areia para guardá-los bem na memória e habituar a mão a escrevê-los.
À noite, quando pude entrar em casa sem ser visto, para evitar indiscretas perguntas do encarregado, ainda continuei no quarto a engolir o meu "a-b-c" malaio, e, com tanto afinco levei o propósito que, de manhã, o sabia perfeitamente.
Convenci-me que aquela era a língua mais fácil do mundo e saí; mas não tão cedo que não me encontrasse com o encarregado dos aluguéis dos cômodos:
- Senhor Castelo, quando salda a sua conta?
Respondi-lhe então eu, com a mais encantadora esperança:
- Breve... Espere um pouco... Tenha paciência... Vou ser nomeado professor de javanês, e...
Por aí o homem interrompeu-me:
- Que diabo vem a ser isso, Senhor Castelo?
Gostei da diversão e ataquei o patriotismo do homem:
- É uma língua que se fala lá pelas bandas do Timor. Sabe onde é?
Oh! alma ingênua! O homem esqueceu-se da minha dívida e disse-me com aquele falar forte dos portugueses:
- Eu cá por mim, não sei bem; mas ouvi dizer que são umas terras que temos lá para os lados de Macau. E o senhor sabe isso, Senhor Castelo?
Animado com esta saída feliz que me deu o javanês, voltei a procurar o anúncio. Lá estava ele. Resolvi animosamente propor-me ao professorado do idioma oceânico. Redigi a resposta, passei pelo Jornal e lá deixei a carta. Em seguida, voltei à biblioteca e continuei os meus estudos de javanês. Não fiz grandes progressos nesse dia, não sei se por julgar o alfabeto javanês o único saber necessário a um professor de língua malaia ou se por ter me empenhado mais na bibliografia e história literária do idioma que ia ensinar.
Ao cabo de dois dias, recebia eu uma carta para ir falar ao doutor Manuel Feliciano Soares Albernaz, Barão de Jacuecanga, à Rua Conde de Bonfim, não me recordo bem que numero. E preciso não te esqueceres que entrementes continuei estudando o meu malaio, isto é, o tal javanês. Além do alfabeto, fiquei sabendo o nome de alguns autores, também perguntar e responder "como está o senhor?" - e duas ou três regras de gramática, lastrado todo esse saber com vinte palavras do léxico.
Não imaginas as grandes dificuldades com que lutei, para arranjar os quatrocentos réis da viagem! É mais fácil - podes ficar certo - aprender o javanês... Fui a pé. Cheguei suadíssimo; e, Com maternal carinho, as anosas mangueiras, que se perfilavam em alameda diante da casa do titular, me receberam, me acolheram e me reconfortaram. Em toda a minha vida, foi o único momento em que cheguei a sentir a simpatia da natureza...
Era uma casa enorme que parecia estar deserta; estava mal tratada, mas não sei porque me veio pensar que nesse mau tratamento havia mais desleixo e cansaço de viver que mesmo pobreza. Devia haver anos que não era pintada. As paredes descascavam e os beirais do telhado, daquelas telhas vidradas de outros tempos, estavam desguarnecidos aqui e ali, como dentaduras decadentes ou mal cuidadas.
Olhei um pouco o jardim e vi a pujança vingativa com que a tiririca e o carrapicho tinham expulsado os tinhorões e as begônias. Os crótons continuavam, porém, a viver com a sua folhagem de cores mortiças. Bati. Custaram-me a abrir. Veio, por fim, um antigo preto africano, cujas barbas e cabelo de algodão davam à sua fisionomia uma aguda impressão de velhice, doçura e sofrimento.
Na sala, havia uma galeria de retratos: arrogantes senhores de barba em colar se perfilavam enquadrados em imensas molduras douradas, e doces perfis de senhoras, em bandós, com grandes leques, pareciam querer subir aos ares, enfunadas pelos redondos vestidos à balão; mas, daquelas velhas coisas, sobre as quais a poeira punha mais antigüidade e respeito, a que gostei mais de ver foi um belo jarrão de porcelana da China ou da Índia, como se diz. Aquela pureza da louça, a sua fragilidade, a ingenuidade do desenho e aquele seu fosco brilho de luar, diziam-me a mim que aquele objeto tinha sido feito por mãos de criança, a sonhar, para encanto dos olhos fatigados dos velhos desiludidos...
Esperei um instante o dono da casa. Tardou um pouco. Um tanto trôpego, com o lenço de alcobaça na mão, tomando veneravelmente o simonte de antanho, foi cheio de respeito que o vi chegar. Tive vontade de ir-me embora. Mesmo se não fosse ele o discípulo, era sempre um crime mistificar aquele ancião, cuja velhice trazia à tona do meu pensamento alguma coisa de augusto, de sagrado. Hesitei, mas fiquei.
- Eu sou, avancei, o professor de javanês, que o senhor disse precisar.
- Sente-se, respondeu-me o velho. O senhor é daqui, do Rio?
- Não, sou de Canavieiras.
- Como? fez ele. Fale um pouco alto, que sou surdo, - Sou de Canavieiras, na Bahia, insisti eu. - Onde fez os seus estudos?
- Em São Salvador.
- Em onde aprendeu o javanês? indagou ele, com aquela teimosia peculiar aos velhos.
Não contava com essa pergunta, mas imediatamente arquitetei uma mentira. Contei-lhe que meu pai era javanês. Tripulante de um navio mercante, viera ter à Bahia, estabelecera-se nas proximidades de Canavieiras como pescador, casara, prosperara e fora com ele que aprendi javanês.
- E ele acreditou? E o físico? perguntou meu amigo, que até então me ouvira calado.
- Não sou, objetei, lá muito diferente de um javanês. Estes meus cabelos corridos, duros e grossos e a minha pele basané podem dar-me muito bem o aspecto de um mestiço de malaio...Tu sabes bem que, entre nós, há de tudo: índios, malaios, taitianos, malgaches, guanches, até godos. É uma comparsaria de raças e tipos de fazer inveja ao mundo inteiro.
- Bem, fez o meu amigo, continua.
- O velho, emendei eu, ouviu-me atentamente, considerou demoradamente o meu físico, pareceu que me julgava de fato filho de malaio e perguntou-me com doçura:
- Então está disposto a ensinar-me javanês?
- A resposta saiu-me sem querer: - Pois não.
- O senhor há de ficar admirado, aduziu o Barão de Jacuecanga, que eu, nesta idade, ainda queira aprender qualquer coisa, mas...
- Não tenho que admirar. Têm-se visto exemplos e exemplos muito fecundos... ? .
- O que eu quero, meu caro senhor....
- Castelo, adiantei eu.
- O que eu quero, meu caro Senhor Castelo, é cumprir um juramento de família. Não sei se o senhor sabe que eu sou neto do Conselheiro Albernaz, aquele que acompanhou Pedro I, quando abdicou. Voltando de Londres, trouxe para aqui um livro em língua esquisita, a que tinha grande estimação. Fora um hindu ou siamês que lho dera, em Londres, em agradecimento a não sei que serviço prestado por meu avô. Ao morrer meu avô, chamou meu pai e lhe disse: "Filho, tenho este livro aqui, escrito em javanês. Disse-me quem mo deu que ele evita desgraças e traz felicidades para quem o tem. Eu não sei nada ao certo. Em todo o caso, guarda-o; mas, se queres que o fado que me deitou o sábio oriental se cumpra, faze com que teu filho o entenda, para que sempre a nossa raça seja feliz." Meu pai, continuou o velho barão, não acreditou muito na história; contudo, guardou o livro. Às portas da morte, ele mo deu e disse-me o que prometera ao pai. Em começo, pouco caso fiz da história do livro. Deitei-o a um canto e fabriquei minha vida. Cheguei até a esquecer-me dele; mas, de uns tempos a esta parte, tenho passado por tanto desgosto, tantas desgraças têm caído sobre a minha velhice que me 1embrei do talismã da família. Tenho que o ler, que o compreender, se não quero que os meus últimos dias anunciem o desastre da minha posteridade; e, para entendê-lo, é claro, que preciso entender o javanês. Eis aí.
Calou-se e notei que os olhos do velho se tinham orvalhado. Enxugou discretamente os olhos e perguntou-me se queria ver o tal livro. Respondi-lhe que sim. Chamou o criado, deu-lhe as instruções e explicou-me que perdera todos os filhos, sobrinhos, só lhe restando uma filha casada, cuja prole, porém, estava reduzida a um filho, débil de corpo e de saúde frágil e oscilante.
Veio o livro. Era um velho calhamaço, um in-quarto antigo, encadernado em couro, impresso em grandes letras, em um papel amarelado e grosso. Faltava a folha do rosto e por isso não se podia ler a data da impressão. Tinha ainda umas páginas de prefácio, escritas em inglês, onde li que se tratava das histórias do príncipe Kulanga, escritor javanês de muito mérito.
Logo informei disso o velho barão que, não percebendo que eu tinha chegado aí pelo inglês, ficou tendo em alta consideração o meu saber malaio. Estive ainda folheando o cartapácio, à laia de quem sabe magistralmente aquela espécie de vasconço, até que afinal contratamos as condições de preço e de hora, comprometendo-me a fazer com que ele lesse o tal alfarrábio antes de um ano.
Dentro em pouco, dava a minha primeira lição, mas o velho não foi tão diligente quanto eu. Não conseguia aprender a distinguir e a escrever nem sequer quatro letras. Enfim, com metade do alfabeto levamos um mês e o Senhor Barão de Jacuecanga não ficou lá muito senhor da matéria: aprendia e desaprendia.
A filha e o genro (penso que até aí nada sabiam da história do livro) vieram a ter notícias do estudo do velho; não se incomodaram. Acharam graça e julgaram a coisa boa para distraí-lo.
Mas com o que tu vais ficar assombrado, meu caro Castro, é com a admiração que o genro ficou tendo pelo professor de javanês. Que coisa Única! Ele não se cansava de repetir: "É um assombro! Tão moço! Se eu soubesse isso, ah! onde estava !"
O marido de Dona Maria da Glória (assim se chamava a filha do barão), era desembargador, homem relacionado e poderoso; mas não se pejava em mostrar diante de todo o mundo a sua admiração pelo meu javanês. Por outro lado, o barão estava contentíssimo. Ao fim de dois meses, desistira da aprendizagem e pedira-me que lhe traduzisse, um dia sim outro não, um trecho do livro encantado. Bastava entendê-lo, disse-me ele; nada se opunha que outrem o traduzisse e ele ouvisse. Assim evitava a fadiga do estudo e cumpria o encargo.
Sabes bem que até hoje nada sei de javanês, mas compus umas histórias bem tolas e impingi-as ao velhote como sendo do crônicon. Como ele ouvia aquelas bobagens !...
Ficava extático, como se estivesse a ouvir palavras de um anjo. E eu crescia aos seus olhos !
Fez-me morar em sua casa, enchia-me de presentes, aumentava-me o ordenado. Passava, enfim, uma vida regalada.
Contribuiu muito para isso o fato de vir ele a receber uma herança de um seu parente esquecido que vivia em Portugal. O bom velho atribuiu a cousa ao meu javanês; e eu estive quase a crê-lo também.
Fui perdendo os remorsos; mas, em todo o caso, sempre tive medo que me aparecesse pela frente alguém que soubesse o tal patuá malaio. E esse meu temor foi grande, quando o doce barão me mandou com uma carta ao Visconde de Caruru, para que me fizesse entrar na diplomacia. Fiz-lhe todas as objeções: a minha fealdade, a falta de elegância, o meu aspecto tagalo. - "Qual! retrucava ele. Vá, menino; você sabe javanês!" Fui. Mandou-me o visconde para a Secretaria dos Estrangeiros com diversas recomendações. Foi um sucesso.
O diretor chamou os chefes de secção: "Vejam só, um homem que sabe javanês - que portento!"
Os chefes de secção levaram-me aos oficiais e amanuenses e houve um destes que me olhou mais com ódio do que com inveja ou admiração. E todos diziam: "Então sabe javanês? É difícil? Não há quem o saiba aqui!"
O tal amanuense, que me olhou com ódio, acudiu então: "É verdade, mas eu sei canaque. O senhor sabe?" Disse-lhe que não e fui à presença do ministro.
A alta autoridade levantou-se, pôs as mãos às cadeiras, concertou o pince-nez no nariz e perguntou: "Então, sabe javanês?" Respondi-lhe que sim; e, à sua pergunta onde o tinha aprendido, contei-lhe a história do tal pai javanês. "Bem, disse-me o ministro, o senhor não deve ir para a diplomacia; o seu físico não se presta... O bom seria um consulado na Ásia ou Oceania. Por ora, não há vaga, mas vou fazer uma reforma e o senhor entrará. De hoje em diante, porém, fica adido ao meu ministério e quero que, para o ano, parta para Bâle, onde vai representar o Brasil no Congresso de Lingüística. Estude, leia o Hovelacque, o Max Müller, e outros!"
Imagina tu que eu até aí nada sabia de javanês, mas estava empregado e iria representar o Brasil em um congresso de sábios.
O velho barão veio a morrer, passou o livro ao genro para que o fizesse chegar ao neto, quando tivesse a idade conveniente e fez-me uma deixa no testamento.
Pus-me com afã no estudo das línguas maleo-polinésicas; mas não havia meio!
Bem jantado, bem vestido, bem dormido, não tinha energia necessária para fazer entrar na cachola aquelas coisas esquisitas. Comprei livros, assinei revistas: Revue Anthropologique et Linguistique, Proceedings of the English-Oceanic Association, Archivo Glottologico Italiano, o diabo, mas nada! E a minha fama crescia. Na rua, os informados apontavam-me, dizendo aos outros: "Lá vai o sujeito que sabe javanês." Nas livrarias, os gramáticos consultavam-me sobre a colocação dos pronomes no tal jargão das ilhas de Sonda. Recebia cartas dos eruditos do interior, os jornais citavam o meu saber e recusei aceitar uma turma de alunos sequiosos de entenderem o tal javanês. A convite da redação, escrevi, no Jornal do Comércio um artigo de quatro colunas sobre a literatura javanesa antiga e moderna...
- Como, se tu nada sabias? interrompeu-me o atento Castro.
- Muito simplesmente: primeiramente, descrevi a ilha de Java, com o auxílio de dicionários e umas poucas de geografias, e depois citei a mais não poder.
- E nunca duvidaram? perguntou-me ainda o meu amigo.
- Nunca. Isto é, uma vez quase fico perdido. A polícia prendeu um sujeito, um marujo, um tipo bronzeado que só falava uma língua esquisita. Chamaram diversos intérpretes, ninguém o entendia. Fui também chamado, com todos os respeitos que a minha sabedoria merecia, naturalmente. Demorei-me em ir, mas fui afinal. O homem já estava solto, graças à intervenção do cônsul holandês, a quem ele se fez compreender com meia dúzia de palavras holandesas. E o tal marujo era javanês - uf!
Chegou, enfim, a época do congresso, e lá fui para a Europa. Que delícia! Assisti à inauguração e às sessões preparatórias. Inscreveram-me na secção do tupi-guarani e eu abalei para Paris. Antes, porém, fiz publicar no Mensageiro de Bâle o meu retrato, notas biográficas e bibliográficas. Quando voltei, o presidente pediu-me desculpas por me ter dado aquela secção; não conhecia os meus trabalhos e julgara que, por ser eu americano brasileiro, me estava naturalmente indicada a secção do tupi- guarani. Aceitei as explicações e até hoje ainda não pude escrever as minhas obras sobre o javanês, para lhe mandar, conforme prometi.
Acabado o congresso, fiz publicar extratos do artigo do Mensageiro de Bâle, em Berlim, em Turim e Paris, onde os leitores de minhas obras me ofereceram um banquete, presidido pelo Senador Gorot. Custou-me toda essa brincadeira, inclusive o banquete que me foi oferecido, cerca de dez mil francos, quase toda a herança do crédulo e bom Barão de Jacuecanga.
Não perdi meu tempo nem meu dinheiro. Passei a ser uma glória nacional e, ao saltar no cais Pharoux, recebi uma ovação de todas as classes sociais e o presidente da república, dias depois, convidava-me para almoçar em sua companhia.
Dentro de seis meses fui despachado cônsul em Havana, onde estive seis anos e para onde voltarei, a fim de aperfeiçoar os meus estudos das línguas da Malaia, Melanésia e Polinésia.
- É fantástico, observou Castro, agarrando o copo de cerveja.
- Olha: se não fosse estar contente, sabes que ia ser ?
- Que?
- Bacteriologista eminente. V amos?
- Vamos.










Acessado em: 06.06.2007

domingo, 9 de setembro de 2012

Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa




Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa



1 – MUDANÇA NO ALFABETO
O alfabeto, que hoje tem 23 letras, passa a ter 26, com a inclusão de K, W e Y. Porém o uso destas letras fica restrito a apenas alguns casos, como já ocorre atualmente:
a) em antropônimos originários de outras línguas e seus derivados.
Exemplos:

  • Franklin – frankliniano
  • Kant – kantismo
  • Darwin – darwinismo
  • Wagner – wagneriano
  • Byron – byroniano
  • Taylor – taylorista


b) Em topônimos originários de outras línguas e seus derivados.
Exemplos:
  • Kwanza
  • Kwait – kwaitiano
  • Malawi – malawiano
  • Washington
  • New York

c) Em siglas, símbolos e mesmo palavras adotadas como unidades de medida de curso internacional.
Exemplos;

  • TWA
  • KLM
  • West
  • Kg
  • Km
  • Kw
  • Yard
  • Watt
  • WWW



2-ADEUS AO TREMA
a) O trema desaparece nas palavras em português.
Exemplos:


ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
agüentar
Aguentar
Anhangüera
Anhanguera
Aqüífero
Aquífero
Bilíngüe
Bilíngue
Conseqüência
Consequência
Eloqüente
Eloquente
Freqüente
Frequente
Lingüiça
Linguiça
Lingüística
Linguística
Qüinqüênio
Quinqquênio
Sagüi
Sagui
Seqüência
Sequência
Tranqüilo
Tranquilo


b) As exceções são as palavras derivadas de nomes próprios estrangeiros, nas quais o trema será mantido.
Exemplos:
o    Muller – mülleriano
o    Zürich
o    Hübner

3-MUDANÇAS NO USO DO ACENTO AGUDO
a) Os ditongos abertos ei e oi das palavras paroxítonas não serão acentuados.
Exemplos:

ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
Alcalóide
Alcaloide
Apóio
Apoio
Assembléia
Assembleia
Boléia
Boleia
Bóia
Boia
Coréia
Coreia
Epopéia
Epopeia
Heróico
Heroico
Idéia
Ideia
Jibóia
Jiboia
Prosopopéia
Prosopopeia
Paranóico
Paranoico

b) Não serão acentuados i e u tônicos em paroxítonas  quando precedidas de ditongo.
Exemplos:
ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
Baiúca
Baiuca
feiúra
Feiura

c) O acento agudo nos ditongos abertos éi, oi, éu das palavras oxítonas permanece.
Exemplos:
ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
anéis
anéis
céu
céu
chapéu
chapéu
corrói
corrói
dói
dói
fiéis
Fiéis
herói
Herói
lençóis
lençóis
mói
mói
pepéis
papéis
réu
réu
véu
véu

d) Não se acentua mais a letra u nas formas verbais rizotônicas quando precedidas de g ou q antes de e ou i (gue, que, gui, qui)
Exemplos:
ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
Arguo / argúis
Arguo / arguis
averigúo
averiguo


4-MUDANÇA NO USO DO ACENTO CIRCUNFLEXO  ( ^ )
a) O acento circunflexo deixa de existir nas palavras paroxítonas que tenham hiato formado por repetição de vogal (OO)
Exemplos:
ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
Abençôo
Abençoo
Corôo
Coroo
Enjôo
Enjoo
Magôo
Magoo
Perdôo
Perdoo
povôo
povoo
                                

b)Não se acentuará a vogal do hiato ee na 3ª pessoa do plural do presente do indicativo ou do subjuntivo dos verbos CRER, DAR, LER, VER.
Exemplos;
ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
Crêem
Creem
Dêem
Deem
Descrêem
Descreem
Lêem
Leem
Prevêem
Preveem
Relêem
Releem
Revêem
Reveem
vêem
veem

c) Os verbos TER, VIR e SEUS DERIVADOS permanecem com o circunflexo, no plural.
Exemplos:
  • Eles têm
  • Eles vêm

5-ACENTO DIFERENCIAL DAS PALAVRAS HOMÓGRAFAS.
a) deixam de se distinguir pelo acento gráfico

ANTES DO AO
Pára (verbo) / para (preposição)
Péla (verbo pelar) / pela (per + a)
Pélo (verbo pelar) / pêlo (cabelo)
Pólo (norte/sul) / pó-lo (por + lo)
DEPOIS DO AO
Para (verbo) / para (preposição)
Pela (verbo pelar) / pela (por + a)
Pelo (verbo pelar) / pelo (cabelo)
Polo (norte/sul) / po-lo (por + lo)

b) Continuam acentuadas:
  • PÔR (verbo) para que não seja confundido com a preposição por;
  • PÔDE (verbo poder, conjugado no passado)) para que não haja confusão com PODE (o mesmo verbo conjugado no presente).;
  • Nas  palavras FÔRMA e FORMA o acento é facultativo.


6-MUDANÇA NO USO DO HÍFEN ( - )

a)     Quando o prefixo terminar em vogal e o segundo elemento começar com as consoantes S ou R, não se usará o hífen.
Exemplos:
ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
Anti-religioso
Antirreligioso
Anti-semita
Antissemita
Contra-regra
Contrarregra
Extra-regulamentação
extrarregulamentação

b)    quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa com uma vogal diferente o hífen será eliminado.
Exemplos:

ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
Aero-espacial
Aeroespacial
Auto-aprendizagem
Autoaprendizagem
Auto-escola
Autoescola
Auto-estrada
Autoestrada
Extra-escolar
extraescolar

Exceções:
Quando os prefixos terminarem em “r” mantém-se o hífen
Exemplos:
  • Hiper-requintado
  • Inter-racial
  • Super-resistente

c)     Quando o primeiro elemento finalizar com uma vogal igual à do segundo elemento, o hífen deverá ser utilizado.
Exemplos:
o    Anti-inflamatório
o    Micro-ondas

7-DUPLA GRAFIA
A unificação da ortografia não será total. Para algumas palavras será permitida dupla grafia. Isso ocorre principalmente em paroxítonas cuja entonação entre brasileiros e  portugueses é diferente, com inflexão mais aberta ou fechada. Enquanto no Brasil as palavras são acentuadas com o acento circunflexo, em Portugal utiliza-se o acento agudo. Ambas as grafias serão aceitas, como em:

NO BRASIL
EM PORTUGAL
Antônio
António
aritmética
Arimética
cacto
Cato
fenômeno
fenómeno

8-PRINCIPAIS MUDANÇAS NA ORTOGRAFIA DO PORTUGUÊS EUROPEU

a)     a letra “h”, no início de palavras como herva e húmido, desaparecem e essas palavras passam a ser escritas como no Brasil: ERVA, ÚMIDO.

b)    Desaparecem o “c” e o “p” nas palavras onde essas letras não são pronunciadas.

Exemplos:

ANTES DO AO
DEPOIS DO AO
Acto
Ato
Actual
Atual
acção
Ação
Adoptar
Adotar
Aflicto
Aflito
Baptizar
Batizar
colectivo
Coletivo
Correcto
Correto
Director
Diretor
Efectivo
Efetivo
Egipto
Egito
exactamente
Exatamente
óptimo
ótimo



REFERÊNCIAS
BANDEIRA, Cláudio. Alfabeto volta a ter 26 letras. A Tarde, Salvador, 10.06.2006, Caderno de Notícias, p. 11.
BANDEIRA, Cláudio. Reforma Ortográfica Vale a Partir de 2009. A Tarde, Salvador, 29.10.2008, Caderno de Notícias, p. 10.
FERNANDES, Pedro. O que quer, o que pode essa língua. A Tarde, Salvador, 1º.04.2008, Caderno Dez, p. 8-9.
PEREIRA, Maria Helena da Rocha. Acordo Ortográfico – uma questão premente. Jornal das Letras Artes e Idéias. Lisboa, ano XXVII, nº 974, de 30 de janeiro a 12 de fevereiro de 2008, p. 20.
SIQUEIRA, Maria de Lourdes. Novas Regras do Acordo Ortográfico. A Tarde, Salvador, 23.03.2008, Caderno 2, coluna Ler & Escrever, p. 9.
http://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_portuguesa             Acessado em: 20/10/2008.